Vários centros tentam desenvolver estudos farmacológicos procurando minimizar os danos causados pela progressão da doença.
Há um grupo de drogas, os esteróides catabólicos, que mostraram significantes benefícios para os pacientes com distrofia muscular, principalmente para as formas Duchenne, Becker e cinturas, infelizmente com importantes efeitos colaterais.
Em muitos experimentos desde 1970 a prednisona, um esteróide catabólico, tem se mostrado extremamente promissora em diminuir a degeneração muscular. É a droga mais amplamente usada para o tratamento de distrofia muscular de Duchenne – DMD. Em alguns casos a capacidade de caminhar pode ser prolongada por 2 anos ou mais. Não somente a perda muscular é alterada, mas a função e a forma tem uma melhora dramática.
Os esteróides catabólicos ajudam o corpo a liberar a glicose e, portanto, mobilizar energia em resposta ao stress ou perigo. Entretanto, o exato modo pelo qual a prednisona ajuda os pacientes com DM é ainda desconhecido, devendo depender de seus efeitos antinflamatórios ou imunossupressores. Os linfócitos T citotóxicos que migram para a retirada das células lesadas são retardados, minimizando a resposta inflamatória e a fibrose decorrente. Alguns pesquisadores tem especulado que a prednisona possa também estimular a produção de proteínas musculares.
Devido aos seus efeitos relacionados ao metabolismo dos açúcares, os esteróides catabólicos são também conhecidos como glicocorticóides. Eles são produzidos e liberados da porção externa da adrenal (córtex) e, portanto, são também conhecidos como corticosteróides. Prednisona é uma forma sintética de um corticosteróide natural, a hidrocortisona.
Testes controlados claramente confirmam os efeitos positivos da prednisona. Há aumento de força e massa muscular, embora os níveis da enzima CK permaneçam inalterados. Comprovadamente há preservação também da função pulmonar. Por outro lado, quando há uma parada no uso da prednisona, parece haver uma perda rápida dos benefícios adquiridos, não importando quão longo o tempo que foi utilizado.
Os efeitos colaterais com o uso da prednisona não podem ser desprezíveis. Entre eles podemos citar:
a) Retenção de líquidos
b) Retenção de sal
c) Hipertensão arterial – temos visto raramente este efeito.
d) Catarata
e) Diabetes – há um aumento da glicemia devido ao efeito glicocorticóide. Caso haja tendência, pode ocorrer o desenvolvimento de diabetes.
f) Osteoporose – pode ser prevenida com o uso concomitante de suplementos como cálcio e vitamina D.
g) Baixa estatura – pode ser um efeito colateral benéfico em DM. Sabe-se que anões com DMD tem uma forma mais branda da doença.
h) Aumento do apetite – deve-se monitorizar a dieta com finalidade de evitar ao máximo a obesidade.
i) Alterações comportamentais – raras
j) Efeitos imunossupressores – podem ser minimizados através de esquema vacinal completo.
Todo quadro clínico acima descrito configura o que chamamos de Síndrome de Cushing.
k) Possível perda das células satélite que circundam as fibras musculares – estas células tem atraído muita atenção por seu potencial uso em terapia de transferência de stem cells.
Há dúvidas sobre qual a melhor idade para o início da corticoterapia, além de qual esquema seria o mais adequado. Tentando responder algumas questões, o grupo do CIDD (Clinical Investigation of Duchenne Dystrophy), formado por vários grupos que testaram a prednisona no final dos anos 80, mostrou que:
a) A prednisona aumenta a força e a massa muscular
b) O aumento é detectado logo nos primeiros 10 dias de tratamento, havendo um pico em torno de 3 meses e uma manutenção por 18 meses ou mais.
c) Pacientes que tem usado por 3 anos ou mais, o declínio da força e da função é mais lento que os controles com história natural da doença.
d) Há um retardo do declínio da função pulmonar.
e) O regime mais efetivo é de 0,75mg/kg/dia.
f) O regime de dias alternados não mantém a força tão bem e os efeitos colaterais não são significantemente diferentes.
g) O regime de 0,3mg/kg/dia foi também tentado, mas não foi tão efetivo
A razão mais comum da descontinuação da prednisona ou redução da dose é o ganho de peso.
Sansone, Dubowitz et al. descreveram um regime no qual é oferecida prednisona nesta mesma dose ( 0,75mg/kg/dia) por 10 dias no início de cada mês. Eles obtiveram aumento de força até 6 meses, com um lento declínio em 12 a 18 meses. Atualmente estão usando um regime onde a medicação é usada por 10 dias, a seguir é feita uma interrupção por 10 dias, novamente a droga é introduzida por mais 10 dias e assim sucessivamente. Verbalmente foi nos dito que os efeitos são bastante positivos, fato que vai de encontro à nossa experiência.
Recentemente um grupo testou um novo esquema com 10mg/kg/semana por 3-16 meses, dados 5mg/kg/dia em 2 dias consecutivos, com resultados tão positivos quanto o esquema diário e com menores efeitos colaterais. Porém, os estudos estão muito preliminares para uma recomendação mais efetiva.
Deflazacort
Um outro catabólico esteróide, o deflazacort, vem sendo testado para terapia das distrofias musculares, especificamente para DMD. O deflazacort é uma oxazolona derivada da prednisona, com efeitos antinflamatórios e imunossupressores comparáveis a ela. A equivalência terapêutica é de aproximadamente 1,2mg de deflazacort para 1mg de prednisona. Pelos estudos a dose ótima preconizada é de 0,9mg/kg/dia.
Os efeitos de retardamento da degeneração muscular e preservação da função pulmonar foram comparáveis aos da prednisona. Outro achado de impacto foi o retardamento da necessidade cirúrgica para correção da escoliose.
Em relação aos efeitos colaterais, observa-se que os pacientes em uso de deflazacort tem menor ganho ponderal que os de prednisona, porém a incidência de catarata é significativamente maior. A supressão do crescimento é outro efeito colateral importante do deflazacort embora, de forma semelhante à prednisona, este efeito colateral possa ser considerado benéfico para os pacientes com DM.
Uma outra diferença significativa entre os dois corticosteróides citados é o custo do tratamento que é bem maior para o deflazacort
Enfim, a terapia esteróide é a única maneira de comprovadamente retardar os efeitos degenerativos das distrofias musculares. Por ter importantes efeitos colaterais, sua indicação deve ser fruto de uma discussão entre o médico e a família e o seu controle deve ser rigoroso.
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