Há fatos em nosso amado país
que nos deixam tão estarrecidos, que se não gritarmos ao mundo a nossa
profunda indignação talvez não tenhamos moral para olharmo-nos no espelho.
Sou médica, pediatra, e há anos luto pelos doentes com distrofia muscular
progressiva (DMP), cuja forma mais freqüente e também mais grave é a
distrofia de Duchenne. Esta afeta crianças do sexo masculino, de quaisquer raça
ou classe social, levando-as a uma progressiva incapacidade motora, com perda de
deambulação ao redor de 10 anos e uma insuficiência respiratória importante
nas fases mais adiantadas. Apesar de centenas de pesquisas em âmbito mundial, não
há no momento tratamento efetivo para as DMPs.
Até há alguns anos as crianças
acometidas viviam em total abandono sob vários aspectos sociais, desde a
impossibilidade de freqüentar o ambiente escolar, quer pela falta de alguma
condução, quer pelas próprias condições das escolas em recebê-las até a
inexistência de um centro de terapia adequado onde poderiam receber algum tipo
de apoio, entre eles o psicológico e o de fisioterapia especializada nesse tipo
de patologia.
Em 1988, tentando atenuar
esta chocante realidade, foi fundada a Associação Brasileira de Distrofia
Muscular – ABDIM pela Dra. Mayana Zatz, com o apoio do UNIBANCO. Este centro
atende hoje cerca de 100 crianças, fornecendo para boa parte delas também o
transporte e cestas básicas. Na ABDIM recebem o tratamento de fisioterapia,
terapia ocupacional, apoio psicológico, informática. Atualmente a ABDIM luta
para tentar também fazer um centro de referência médico para atender estes
pacientes carentes. A Associação Brasileira de Distrofia Muscular mantém-se
hoje através de doações do UNIBANCO e de pessoas solidárias à causa..
Gostaria de ressaltar que a
presidente da ABDIM, Dra. Mayana Zatz esteve recentemente na mídia por ter
ganho um prêmio internacional dado pela UNESCO por sua atuação social em prol
da distrofia muscular. Ironia !!!
Enfim, é estarrecedor o massacre que a burocracia impõe
sobre aqueles que sofrem, sem ao menos se darem ao trabalho de fazer uma visita
à instituição para avaliarem a importância de seu trabalho.
Por último, não posso deixar de mencionar, que há meses tentamos
contato com o Sr. Ministro da Saúde, Dr. José Serra, pois várias crianças
estão morrendo por não terem condições de adquirir um aparelho
respiratório que lhes permitiria viver mais e com qualidade: a insensível máquina
burocrática transforma-se numa barreira intransponível.
Restam-nos apenas indagações: Quem cuidará das crianças da ABDIM se a
mesma não puder sobreviver com estas medidas? Quem assumirá
a responsabilidade médica e
social desta grave doença nesta população tão carente? Alguém assumirá a
responsabilidade por mortes que venham a ocorrer por falta de aparelhagem
respiratória ou tratamento especializado?
Ana Lúcia Langer
e-mail- [email protected]